segunda-feira, novembro 29, 2010

Para vovó, com carinho.

Ela nasceu nos anos 30, teve um pai rigoroso*, teve um casamento arranjado (como era o costume na arcaica colônia japonesa da São Paulo dos anos 50), foi mãe de três filhos, e ficou viúva antes dos 30 anos.
Era uma mulher bonita. Apreciava a liberdade que os brasileiros tinham, mas não abria mão de velhos costumes, como o respeito, a honra, e a dignidade do dinheiro ganho no trabalho honesto. Para eles, os brasileiros, era D. Odete. Itsuyo era um nome que só existia no CPF.
Aos 16 anos viu a foto de um homem dez anos mais velho, com o qual se casaria uma semana depois, e viria a ter três filhos, e de quem ficaria viúva muito cedo. Foi esposa, muito antes de ser mulher. E disso ela se arrependeu. Antes de partir, repetia aos netos que o esposo era um grande homem. Se arrependeu de não ter sido somente dele. As pessoas erram. As pessoas perdoam...a maioria pelo menos.
De família simples, trabalhou na lavoura, no comércio, foi costureira, leiteira e sacoleira. Por fim se aposentou, orgulhosa de todos os anos de trabalho duro. Coisa rara nos dias de hoje...muito rara.
Dos dias de criança, me lembro dela fumando um cigarro mentolado, e me explicando porque o café dela não era doce. Quando crescí, descobrí que tínhamos o mesmo tipo de diabetes.
Foi dela que ganhei meu primeiro ( e único) cachorro. Um pequinês, chamado Nike.
Anos mais tarde, quando o segundo AVC lhe tirou os movimentos do corpo inteiro, se negou a pensar em morrer. Resistiu por dez anos.
Vovó faleceu ontem, e levou consigo um olhar sereno, típico daqueles que vão em paz...não houve dor ou sofrimento, apenas a tristeza de ir embora no meio da vida. Sentirei sua falta.
Um dia, quando eu me encontrar com todos os que vieram antes de mim, dizer-lhe ei o quanto foi importante pra mim tê-la em minha vida. Até lá, vou guardar cada palavra entre as pedras do meu coração...vá com os anjos, vá em paz...
Com amor, seu neto Bony.

*mesmo morando no Brasil, o meu bisavô criou os filhos com todo o rigor que a cultura japonesa lhe permitiu, não deixando que fizesse um ensino superior. Festas então, nem pensar.

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